sexta-feira, 20 de março de 2015

Conto de Bambas de Rosicler Padilha





...Em uma tarde quente, de vento agradável e arrefecedor, na Quadra do Imperadores do Samba aconteceu o “Conto de Bamba”, evento organizado pelo Curso de Mestre Sala e Porta Bandeira e Porta Estandarte, o Padedê do Samba. Aproveitei o ensejo para contar mais um capítulo da nossa coluna “ouvindo Histórias”...

Inspirada, a porta bandeira Rosicler Padilha nos brindou com sua história, seu ingresso no carnaval, experiências e deu importantes conselhos a todos os presentes de como se portar e de como se tornar um destaque de sucesso...

Ela nos conta que conheceu o carnaval por acaso, através de amizades. Foi, influenciada por amigas, a procura do estrelato na fase da adolescência, que ela procurou investir em concursos de beleza, o sonho de todas as meninas desta fase. Ela nos conta que não venceu nenhum concurso, mas ela persistiu.

Convidada por uma amiga, Viviane, que desfilava na comissão de frente do Império da Zona Norte, foram até um atelier para a referida amiga experimentar a fantasia. Chegando lá, ela conheceu o Mestre Sala Zoca. Neste momento, ele se encontrava muito aflito e desabafa as duas expectadoras de que sua porta bandeira estava grávida e não poderia desfilar com ele naquele ano... comentou também de que seu problema era grave, pois não tinha quem substituísse a consagrada Porta Bandeira Itanajara. Que inclusive havia mais um agravante: o de que a porta bandeira já teria recebido a metade do cachê. Foi quando Rosicler se interessou pelo assunto, pergunta:

“[...]... Espere aí... me responda... como assim, a porta bandeira recebe dinheiro para desfilar no carnaval?”[...]”... Eis que ele responde: [...]...sim, recebe sim![...]”. Ela retoma dizendo: “[...]... mas então está aqui a tua porta bandeira, eu vou desfilar com você...[...]”

Quem assistiu Rosicler dançando glamorosa e bem produzida, jamais pensaria que quando adolescente ela era “dark” – sim, dark, uma espécie de rebelde, no estilo gótico, que nos anos 80 e 90 vestiam-se com roupas pretas e usavam maquiagens da mesma cor numa forma de protesto pela sociedade constituída.

Disposta e decidida, ela insistiu com Zoca que ia ser sua porta bandeira. Isto era outubro de 1991 e faltavam quatro meses para os desfiles... Rose não tinha a mínima idéia do que deveria fazer, conta que nem andava de salto, pois estava acostumada com seu “coturno”, uma espécie de bota, outra característica dos que vestiam-se de preto... mas lá se foi ela... munida da coragem de se tornar uma Porta Bandeira...

Então, sua carreira começou nos idos de 1992, no Império da Zona Norte... depois de muitos ensaios ela foi anunciada como 1ª Porta Bandeira. Em sua primeira apresentação oficial, em uma muamba, minutos antes de entrar na passarela, ela presencia um assassinato, em estado de choque ela adentra pela primeira vez na passarela, um misto de medo e emoção... mas ao final, conseguiu cumprir o percurso e desfilar.

No dia do desfile oficial, outro fatídico episódio: sumiu o primeiro pavilhão! Desespero total! E para piorar a situação, não havia uma liderança da escola no local que tomasse uma atitude, então alguém corre até a quadra da Escola e, improvisaram um cabo de vassoura e um estandarte que não seria utilizado... e, com aquele estandarte "virado" em forma de bandeira, lá se foram Rosicler e Zoca, mesmo com todas estas dificuldades, bailaram como nunca e conseguiram a nota 10!

Rosicler e Zoca com o estandarte-bandeira. Foto de seu arquivo pessoal.

Após este carnaval, foi convidada pela Ana Marilda Bellos para formar um grupo de apresentações para ir para o Japão. Foram para a cidade de Kanasawa, que na época fazia projetos de intercâmbio cultural com outras cidades no mundo. Embarcaram para o Japão Rosicler, Ana, Girozinho, Carla Pires e Mestre Estevão. “[...]...Foi muito interessante, pois todos tinham que fazer de tudo, eu era passista, bailarina, garota de Ipanema e Porta Bandeira...[...]”.

Rosicler, após contar algumas histórias e experiências, nos deu conselhos, que em minha opinião são muito pertinentes, nos dizendo que [...] o sucesso de um destaque é o quanto ele se dedicou para a sua carreira e o resultado vai estar no seu desempenho...[...]”. Ela acrecenta sabiamente que:[...]...para você ter sucesso e se tornar um campeão, você tem que ter muita disciplina, muito amor naquilo que você quer, naquilo que você sonha e naquilo que você almeja[...]”.

Sua sapiência foi além, com muita propriedade falou do comportamento que tinha e que verificava a forma como os demais destaques se comportavam. Ela enfatiza que ser destaque de uma Escola de Samba é algo muito importante, tanto para a pessoa, para o artista, como para a entidade, tamanha é esta importância que o destaque que se apresenta deve ter em mente que:

[...]... as pessoas que vem nos assistir, elas querem ver um diferencial, um sorriso, um brilho no olhar, alegres, elas querem ver o que não se vê no dia a dia, pois o carnaval é alegria, carnaval é paixão, é um estado de espírito, uma maravilha... e as pessoas quando nos assistem, querem ver tudo isso em vocês destaques, vocês tem que oferecer isso ao público, é por isso que eles saem de suas casas, e vão até a quadra ou avenida para prestigiar cada um de vocês... o público quer ver algo diferente... as pessoas pagam ingresso para assistir vocês... façam da dança algo transformador, não transmitam cansaço, tristeza... não se comportem de forma inadequada, o destaque tem que transmitir alegria, vontade, beleza... é como se as pessoas quisessem “pegar”um pouco da energia de vocês, e levar para suas casas...[...]

Como os ouvintes de sua palestra eram muitos aspirantes ao estrelato, ao ‘glamour’ da passarela, ela deu alguns conselhos. Conselhos que em minha opinião são muito pertinentes. Em suas palavras, Rosicler, muito inspirada nos disse:

“[...] Não desistam no primeiro obstáculo, pois muitos vão rir de você, mas se continuar, persistir e melhorar, quem tem meta, as dificuldades são pequenas. Com objetivo e disciplina e um pouco de tempo para adquirir experiência, vc vai longe. Pois tudo aquilo que você vê uma pessoa, um destque, fazer bem feito hoje, é porque ela treinou muito, ensaiou muito para conseguir aquela perfeição. Nada é pronto, tudo é conquistado, nada é do dia para a noite que ela deu um ‘girinho’ e que ela conseguiu... a pessoa que quer ser boa, tem que ensaiar, tem que se dedicar, tem que ser disciplinado, tem que ser organizado... neste meu caminho eu conheci muitas pessoas organizadas, muitas outras não organizadas e todas as que não eram organizadas não conseguiram o sucesso.[...]”

Ao final da palestra ela agradeceu a todas aquelas pessoas que a ajudaram, ao longo de sua carreira, citou alguns nomes como o de Rosalina Conceição, Onira Pereira, Mario Nienow... Agradeceu especialmente a sua mãe e parabenizou aos pais, mães e responsáveis pelos alunos que estavam presentes, destacou quão admirável é a dedicação destes pais em prol do desenvolvimento dos destaques.

[...] Quero agradecer a minha afilhada Simone Ribeiro, que hoje está a frente deste projeto maravilhoso que é o Padedê do Samba... e lembro que não tínhamos a quem recorrer, e quem nos ensinar, aprendíamos com a escola da vida... queria eu ter esta oportunidade de ter tido esta oportunidades que os alunos tem hoje... [...]

Para finalizar ela deu mais um conselho aos que assistiam sua palestra, ela diz: “[...] Aproveitem as oportunidades... eu não deixei passar nenhuma na minha vida. Todas as oportunidades que surgiram eu fui lá e fiz valer...[...]”.
Ramão Carvalho
Março/2015.

Nenhum comentário:

Postar um comentário